A realidade do ensino remoto no estado do Rio Grande do Sul


          O governo estadual prometeu liberação de dados móveis, apesar do acordo com as operadoras de telefonia móvel, haverá uma burocracia gigantesca pela necessidade da atualização dos dados cadastrais de pais e estudantes. A liberação será dada por CPF, não apenas pelo login com e-mail do domínio Educar. É um absurdo que as operadoras, que já dão acesso ilimitado a mensageiros e aplicativos de redes sociais, não dêem em acordo com governo o acesso irrestrito as plataformas educacionais, ainda mais considerando período em que vivemos.
            Mesmo com a adesão de pais e estudantes ao programa, não há acordos a respeito da internet via cabo ou fibra óptica (que muitos de nós utilizamos). Não há qualquer acordo com essas prestadoras de serviço, assim como não se vislumbra recebimento de equipamentos pelos discentes. Vale recordar, aqui, que muitos estudantes, pais e responsáveis venderam celulares e outros aparelhos para pagamento de despesas domésticas, ou mesmo não possuem aparelhos com atualização que rodem os devidos aplicativos. Ainda, em muitas residências, um celular ou computador é utilizado para trabalho remoto das famílias e para estudo de 3 ou mais crianças e adolescentes.
            Isso, sem contar o endividamento dos docentes, pois já passamos por um processo doloroso de salários congelados e parcelados há 6 anos, agora precisamos ampliar nosso endividamento adquirindo celulares, tablets, câmeras e outros acessórios para melhorar a qualidade das aulas remotas. O governo não deu subsídios aos servidores da educação e não os dará.
            Ainda sobre o acesso, cabe salientar que o governo do Rio Grande do Sul vendeu os dados dos milhares de professores e estudantes de rede estadual para uma grande multinacional. Contudo, poderíamos ter usado nossos desenvolvedores locais para criar uma plataforma própria, como muitas universidades públicas possuem. Mantendo sigilo dos dados e de acesso facilitado para todos. Mas a equipe do governador Eduardo Leite (PSDB) preferiu uma parceria com empresas privadas. Não bastasse a dificuldade de acesso, ainda afirmam que seremos uma "case de sucesso do Classroom" o que não é verdade, visto que são mais de 300 mil estudantes que ainda não se vincularam as contas criadas.
            Além disso não passamos pelo processo de alfabetização digital nas escolas, mesmo que se discuta o uso de mídias e tecnologias há mais de uma década. Percebemos inclusive, com as aulas remotas, que a dificuldade não provém apenas da ausência de formação continuada dos docentes, mas de uma falta de letramento digital também dos estudantes e suas famílias. Utilizar um mensageiro ou uma rede social é muito diferente de se apropriar dos recursos de uma Sala de Aula Virtual ou de usar outras ferramentas.
            Um dos exemplos dessa total ausência de alfabetização (ou letramento) digital está nos e-mails enviados para escola, com solicitações de acesso domínio Educar: os pais e estudantes pedem acesso, mas não enviam dados no corpo da mensagem (tais como nome do aluno e turma). Além disso qualquer erro do aplicativo devido as atualizações é um caos. Recebemos diariamente mensagens pedindo suporte, são sempre problemas técnicos simples de serem resolvidos, mas os pais e estudantes não sabem como fazer e muitos docentes não sabem como ajudar.
            No mais, para além do ensino remoto, há no estado as bandeiras do conhecido "distanciamento controlado" (inclusive modelo que foi aclamado pela mídia nacional),  mas existe uma falta de entendimento sobre as bandeiras e sobre a transmissão do novo coronavírus. A E.E.E.B. Presidente Roosevelt, por exemplo, possui uma página em rede social para postagens de informativos, e é comum pais e responsáveis  reclamarem que ligam para escola e não são atendidos,  como se os plantões de atendimento interno fossem obrigatoriamente de 24 horas. Além disso, é comum as reclamações nos finais de semana de que a escola não retorna e-mails enviados em domingos, ou que não foram respondidos nos comentários das publicações no período da madrugada.
            Finalizando, apesar da Lei de Diretrizes e Bases da Educação abordar a Gestão Democrática, as escolas tiveram esse direito boicotado. Não nos foi permitido discutir com a comunidade escolar como se daria o processo de construção das aulas remotas e a inserção do ensino híbrido conforme as múltiplas realidades. Não tivemos o direito de PENSAR JUNTOS (gestores, docentes, discentes e pais/responsáveis) em soluções e formas de minimizar os impactos da pandemia no processo de aprendizagem de nossos estudantes. Conhecemos nossa realidade escolar, vivemos o chão da escola, mas não fomos ouvidos. O uso das salas de aula virtuais foi uma imposição, como tem sido todo processo. Até mesmo as matrizes curriculares, com os exatos objetos do conhecimento a serem trabalhados por componente curricular foram enviados as escolas, sem reconhecimento das realidades e sem a possibilidade de reestruturarmos conforme as nossas necessidades e o andamento que tínhamos nas aulas presenciais das primeiras semanas.


Paola da Costa Silveira
Professora da E.E.E.B. Presidente Roosevelt/Porto Alegre-RS

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